Crônicas

Milênios de Estagnação

Autor - O. S. Berquó

Desde que o homem se conhece como tal, empreende ou diz empreender uma busca interminável: justiça social e felicidade coletiva. Quando começamos a nos reunir em grupos para proteção e sobrevivência há milhares de anos, estávamos começando a construir o que temos hoje. Regiões consideradas berços da civilização, como a Mesopotâmia e a China, deram o passo fundamental para acelerar o início da busca sem fim que ainda perseguimos. Estamos muito, muito longe de nosso objetivo. Milhares de reis, imperadores, presidentes, enfim, pessoas que governam vieram e se foram. Outros tantos partidos, castas, etnias ou seja lá como se chamam ou se chamaram os grupos que se unem ou se uniram para defender uma linha, uma direção para o progresso, o desenvolvimento e a felicidade geral, não atingiram seus objetivos. Em todos os casos havia e há algo em comum: promessas.
Discursos maravilhosos, recheados de palavras bonitas para demonstrar a erudição e o preparo dos doutos postulantes a salvadores da pátria, muitas vezes encomendados a profissionais, encantam os incautos e perpetuam a mesmice. Milhares de anos se passaram e continuamos na mesma. A estrutura se mantém igual a de sempre: um pequeno grupo dono do poder, cercado de mordomias e especializado em buscar sua manutenção nesta condição; um grupo intermediário que se acomoda na sua tarefa de manter a máquina funcionando e quase feliz por não estar no terceiro grupo; e o grupo tragicamente numeroso que acaba por sustentar tudo, satisfeito com as migalhas, com os gladiadores e com as vãs promessas de melhores dias.
É certo que temos televisão, temos cotas, ventiladores, video games e celulares. Muitas outras coisas maravilhosas temos hoje que cinco mil anos atrás nem se sonhava. Coitados. Verdade é, também, que a longevidade aumentou enormemente, em grande parte pela queda da mortalidade infantil: ficaremos mais tempo neste mundo. Dependendo de onde se está, isto é bom, ou não.
Mas junto com estes avanços e brinquedinhos tecnológicos sensacionais vieram outras coisas: filas intermináveis nos hospitais públicos e gente morrendo em macas pelos corredores; esgotos correndo a céu aberto entre as moradias mais afastadas onde está grande parte da população e aposentadorias pífias, entre tantos outros progressos modernos conseguidos após milhares de anos de gestão desastrosa, para dizer o mínimo. Eles vem e vão, eles se alternam e tudo continua na mesma. O fato é que os anos vão passando, os séculos vão ficando para tráz e a estrutura social se mantém a mesma, imutável e soberana. Mas há a democracia, dirão alguns. Realmente, será um grande avanço quando, e somente quando, o povo tiver acesso a uma educação de qualidade que o insira no mundo como ser digno e capaz de escolhas desatreladas de missangas e espelhinhos de mão. Não existe democracia, pelo menos tendo em mente o objetivo maior, focando em quem está para ser escolhido. Para termos um pouco de esperança no futuro da humanidade temos que apostar nas pessoas. Não na chamada “elite” que demonstrou cabalmente nesta enormidade de tempo que está a comandar que é completamente, para ser brando, incompetente. Discussões intermináveis sobre o que pouco interessa e negligência sistemática aos problemas reais e urgentes fazem parte do cotidiano. O problema está nas alturas, só que olharam para o lado errado. Olhem para o alto dos morros, onde estão as pessoas e invistam nelas. O preço do descaso é, logo ali adiante, licitar a compra de blindados urbanos. Mas parece ser bom discutir o que sai nos jornais. Mídia qualquer, jornal, tv, lentes, que maravilha! Os doutos que surgem aos punhados em cada esquina das alamedas do poder, parecem gostar mesmo é de seus espelhos. Há que surgir, para por um fim a estes milhares de anos de estagnação, alguém que se disponha a mexer nas estruturas, acabar com os dogmas perpetuadores do status quo, e que não tenha medo de gerenciar para o bem da população menos favorecida. E isto não significa, de forma alguma, fazer vontades. Mas há que se ter cuidado com os guardiães de plantão que adoram sacudir uma bandeira, quanto mais popular, melhor, mesmo que enganosa, mesmo que signifique manter uma situação nefasta. Precisamos de quem não tema romper a parede que nos aparta da verdadeira busca pelo bem comum e que não se importe em desatar as eternas amarras da necessidade de conluios, conchavos e acertos políticos. A luta deste ser, que não sei se existe, será árdua e muitas barreiras terão que ser ultrapassadas. Séculos de conformismo, acomodação, costumes e verdades fabricadas terão que ficar para trás.
Os palanques estão sendo montados novamente, Deus nos ajude. Mas é exatamente esta a hora de começarmos a despertar de nosso longo sono.
Precisamos encontrar o caminho para a felicidade. Não a felicidade de um ou de alguns, mas a felicidade de todos.


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